Objectivo Ramelau
Bem sei que já desde 24 de Dezembro passado que não publico um único post. Tal ausência tem como justificação aos muitos e-mail’s que vou recebendo de pessoas que não deixam comentários mas optam por “clicar” no icon da carta. Mas também à intensa vida social que tenho tido.
O Ramelau é o pico mais alto da ilha de Timor e foi outrora o pico mais alto do território português. Com uma altitude máxima de 2963 metros, dista da cidade de Dili uns 200 km para Norte-Nordeste.
No dia 11 de Novembro, Sábado, e fazendo parte das actividades lúdicas do fim-de-semana, o grupo onde eu mais ou menos estou inserido decidiu subir a dita montanha. Éramos doze pessoas com idades compreendidas sensivelmente entre os cinquenta e cinco e os vinte e cinco anos, homens e senhoras. Saímos do nosso hotel em Dili pelas 11.30 em automóveis de todo-o-terreno, porque as estradas timorenses não são para brincadeiras, carregados de víveres e agasalhos.
Sai-se de Dili por Sul subindo as montanhas que rodeiam a capital timorense. A viagem é muito atribulada, pois para além de estradas em muito mau estado, são estreitas e a desabar pela ribanceira a qualquer momento. Dizem que no tempo das chuvas é muito pior, porque verdadeiros rios com quedas de água cortam as estradas, impossibilitando a passagem do tráfego. O trânsito nestas estradas é muito reduzido, não só devido às condições péssimas de deslocação como também a viatura própria não abunda neste país. Portanto aquilo que podemos encontrar são outros “Malai” (estrangeiros) a passear de “Jeep”, camiões de transporte, motorizadas e “Microlets”, pequenas carrinhas de caixa fechada adaptadas ao transporte de pessoas.
Duas horas depois chegámos a Ailéu depois de termos passado por Maubisse. Em Ailéu, almoçámos no único “restaurante” digno desse nome que já era sobejamente conhecido do pessoal mais veterano. Comida farta, mais ou menos portuguesa, eis aqui, nós com o estômago aconchegado para enfrentarmos o resto da viagem, que daí para a frente seria muito pior. Após passarmos por vales lindos onde se cultiva essencialmente arroz, e onde os pachorrentos búfalos coabitam com diversos animais alados existentes, póneis, vacas, cabras e porcos, partilhando os verdes campos separados entre si por muros de terra de modo a não deixarem escapar a água indispensável ao cultivo do arroz.
A uma dada altura do trajecto, e a mais do que duas horas do fim da jornada iniciámos um caminho de pedras e de terra batida, saindo assim do asfalto que até então tínhamos percorrido. Foi neste percurso muito moroso, que encontrámos um tipo de pessoas com uma tez de pele muito escura, mais encorpados do que o pessoal que mora junto ao litoral e com os cabelos mais ou menos encaracolados. Esta gente muito humilde, vive normalmente em casas feitas que materiais naturais recolhidos na natureza, e sobrevivem com o que a terra dá. Cultivam pequenas hortas, recolhem frutos e raízes selvagens e têm gado suíno, caprino, bovino e cavalgar.
Pelas 19.00 chegámos à aldeia de Hato-Builico, situada no sopé do Ramelau a uns 2000 metros de altitude, dominada pela casa apalaçada do antigo governador colonial português e que se encontra parcialmente abandonada, tendo sido uma pousada no tempo indonésio.
O termo pousada em Timor é muito abonatório (exceptuando a de Baucau, essa sim uma verdadeira pousada). Normalmente quer dizer uma casa mais ou menos tradicional e cuidada (comparada com as demais existentes) onde se alugam quartos. Pois nós ficámos alojados na única pousada desta aldeia, a pousada do senhor Alexandre, onde a ocupámos por completo.
Depois de nos instalarmos, fizemos uma jantarada com parte do farnel que trouxemos de Dili. E tínhamos que ser lestos a comer pois a corrente eléctrica proveniente do único gerador público da aldeia, ia ser cortada pelas 22.00. Pelas 21.30 já quase toda a gente se tinha ido deitar, inclusive eu, porque a alvorada estava marcada para as três da madrugada. Quando acordei e fui para a rua deparei-me com um dos maiores espectáculos que alguma vez deparei em toda a minha vida. Não havia uma única luz artificial à vista, e a aldeia estava mergulhada num breu tal, que a luz proveniente do céu estrelado era a única a iluminar a natureza. Não exitei e fotografei o momento.
Às três e um quarto fomos para os carros onde subimos até onde eles podia ir. Até aos 2200 metros, altura essa, e com a ajuda de dois guias pagos a dez dólares americanos cada, e mais uma gorjeta se gostássemos do serviço prestado, iniciámos a subida quase a pique até ao cume com o objectivo de lá ver o nascer do sol. Os trilhos usados são muito estreitos e rapidamente se precipitam para o espaço vazio, montanha a baixo. Apesar de estarmos a transpirar devido à subida, notámos que a temperatura começou a baixar acentuadamente. Pelas cinco da manhã atingimos uma altitude onde se fazia sentir um vento muito forte e gélido, depressa cheguei à conclusão que os agasalhos que levei não eram suficientes, e como resultado passei umas horas a bater o dente como muita intensidade, o que é a coisa mais estúpida em Timor, onde as temperaturas ao nível do mar são de abafar.
Pelas cinco horas parámos num local abrigado a escassos vinte minutos do cume. E sabíamos que o nascer do Sol seria pouco depois das seis da manhã. Aproveitámos esse local para retemperar forças, comer, passar pelas brasas e aquecermo-nos com uma pequena fogueira rapidamente improvisada pelos guias.
Às cinco e meia iniciámos o ataque final à montanha, a conquista do cume onde se encontra uma estatueta de Nossa Senhora doada pela cooperação militar portuguesa há uns anos atrás, e que vela por esta jovem nação.
Depois do último trecho da subida que foi bastante íngreme e num meio ambiente de tão gelado que fazia doer os meus ossos, deparámo-nos com um espectáculo de beleza tão rara, que não dava para acreditar. Apesar do vento e das conversas de circunstância, toda a gente parou para ver o início de um novo dia. Primeiro muito timidamente e depois com uma exuberância extrema, o Sol rompeu do horizonte fazendo desde logo aquecer o ambiente e a vontade dos presentes em registar o momento nas suas câmeras. Eu não fui excepção.
Pouco mais do que meia hora, foi o tempo máximo que estivemos lá em cima. E desde logo iniciámos a descida. Durante a caminhada que para mim foi mais penosa em direcção ao sopé da montanha deparámo-nos com o que não tínhamos conseguido ver durante a penumbra aquando da subida. A floresta composta por árvores gigantescas estava na sua grande maioria queimada, dizem pelos indonésios quando andavam no encalço da resistência timorense.
Pouco mais de uma hora, foi o que demorámos a chegar aos carros. Deixo-vos uma pequena colecção de fotos que tirei durante esta minha pequena aventura.
Posições Google Earth relativas ao Ramelau:
http://rapidshare.com/files/15620274/Ramelau_Timor.zip.html


4 Comments:
Lindo, estou com água na boca.
Só existe uma maneira de tirares essa água da boca. Arranjar uns trocos e dar uma volta por aqui.
Já tenho alguns contactos que me podem ser de uma grande utilidade.
Daqui tudo parece tao fascinante, mas tenho a certeza que existe uma riqueza unica que so alguns saberao apreciar. Tenho tb uma tesouro ah minha espera: Acores, que me vai dar mt para descobrir e tempo para apreciar o seu blog. Um abraco Rui Xavier
Caro Xavier,
espero que a sua missão nos Açores seja calma e com boas experiências.
Tenho ido a Ponta Delgada, e aquilo está bem diferente de outros tempo. Diferente para melhor, claro.
Quanto ao tempo, tenho a certeza que vai ter para ler este blog e tantas outras coisas.
Vou mantendo este blog actualizado com coisas relevantes da minha estada em Timor-Leste, sempre de um ponto de vista natural, cultural e humano.
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